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Livro resgata memória da 1ª turma de Paulo Freire em Angicos
60 anos depois
Angicos é uma cidade do RN localizada a cerca de 170 quilômetros da capital Natal. Assim como boa parte dos pequenos municípios do Sertão nordestino nos idos de 1960, a sobrevivência das famílias dependia quase que exclusivamente da agricultura de subsistência e, acrescida a essa pobreza, estima-se que o índice de analfabetismo entre a população de jovens e adultos chegava a 70% dos 9 mil habitantes.
Movido pela utopia de transformar esse cenário, o educador Paulo Freire levou à cidade de Angicos, em 1963, a experiência pioneira de alfabetização que visava ensinar os não letrados em até 40 horas. A iniciativa atraiu cerca de 300 homens e mulheres que durante aproximadamente dois meses se reuniam todas as noites nas casas cedidas por moradores e prédios públicos para assistir às aulas, desenvolvidas por meio de círculos de cultura.
O objetivo foi alcançado! A primeira turma foi diplomada em uma solenidade prestigiada pelas maiores autoridades do Brasil, entre elas o presidente da República, João Goulart, e logo virou notícia no jornal americano New York Times, que retratou a experiência como sendo um sucesso.
Após a turma de Angicos, o projeto expandiu para outras cidades potiguares e também nos Estado de SP, RJ, Brasília, Sergipe e Rio Grande do Sul. Em janeiro de 64, ele foi transformado no Programa Nacional de Alfabetização, mas interrompido pela ditadura militar.
Quase seis décadas depois desde a experiência piloto, os jornalistas Higo Lima e Renata Jaguaribe, ambos cearenses, e Passos Júnior, potiguar, localizaram 19 moradores de Angicos que se formaram na primeira turma de Paulo Freire. Esse encontro rendeu o livro “40 Horas de Angicos: memórias dos alunos de Paulo Freire no RN”, que está sendo lançado nesta sexta-feira, dia 19, às 18h, no Memorial do IFCE, na Rua Jorge Dumar, 1703, Jardim América.
São 19 crônicas a partir das memórias dos estudantes, todos eles já com idade entre 70 a 80 anos, que evidenciam as memórias dos encontros diários, a convivência amorosa com Paulo Freire e os monitores, os desafios do método, a realidade sofrida da região e, sobretudo, o legado da experiência. “Passe o tempo que passar, o conteúdo das 40 Horas permanece relevante pela sua importância histórica a partir das palavras ainda lúcidas de seus personagens”, destaca Renata Jaguaribe.
O jornalista Higo Lima pontua a importância de reavivar o legado do professor Paulo Freire. “A vida daquelas pessoas e, na verdade, a vida de uma cidade inteira, foi transformada pelo poder da educação. Não existe legado maior que esse em um País marcado por tantas desigualdades”, defende Lima.
O que se vivenciou em Angicos nos anos sessenta é parte fundamental nas contribuições de Paulo Freire no campo da Pedagogia. “A riqueza dos depoimentos deixa ainda mais forte a importância do projeto iniciado na cidade de Angicos, que é considerado a gênese da teoria pedagógica e metodologia defendida por Paulo Freire”, explica Passos Júnior.